sexta-feira, 27 de novembro de 2009
quinta-feira, 26 de novembro de 2009
infiltração
segunda-feira, 23 de novembro de 2009
m(eu)s
quarta-feira, 18 de novembro de 2009
café au voie lactée
segunda-feira, 16 de novembro de 2009
sábado, 14 de novembro de 2009
amanhã sem sal
sexta-feira, 13 de novembro de 2009
seu debate à sós
quinta-feira, 12 de novembro de 2009
gaivotas e pinguins
passando a observar
gaivotas navegam nos ventos
eu decolo do mar
Ensaio do Vazio
Passou. Mais rápido que qualquer comparação tosca tal qual “como uma flecha” ou, impossível ser mais clichê, “como num piscar de olhos” poderia descrever. Simplesmente passou. Talvez fosse isso que doesse. Não era nem bem uma dor, mas um vazio. De qualquer maneira, a questão é que não estava mais lá. Veja, algo tão sólido que se podia palpar e saborear, mesmo que em devaneios, agora era apenas ausência. Também não sabia do que, mas aquela ausência parecia tão real e sólida quanto sua causa. Não que desconfiasse de sua causa, mas pelo menos sabia que ali jazia o foco da questão, como dizem os malditos professores de matemática. Permitiu-se pensar então matematicamente para perceber onde estava a falha no raciocínio. Estava ponderando da ausência de algo que não tinha idéia do que era. O pior era sentir a falta dessa presença anônima (e, se permite dizer, por mais desafiador que possa ser descrevê-la, a angústia em perdê-la era pior). Era pior mesmo a falta do fôlego que ela havia lhe dado, da disposição em andar por horas às 5 da manhã em passos largos. Se pudesse dividir o tempo em fração... Talvez assim tivesse condição para perceber o instante exato em que ela desaparecera. “Se”, “talvez”: mais ponderações inúteis. Fato era um: não estava mais lá. Não estava mais lá e só agora havia se dado conta de que permanecera imóvel na praça que corta seu caminho, àquelas horas nada mais que um monumento bizarro e deserto, apenas iluminado pela lua cheia. E tão estática quanto sua postura era seu olhar para a lua. Um flash lhe veio à cabeça: lembrava muito bem de ter visto aquela lua quando estava em êxtase. O que chamo de “presença” por não poder revelar ainda sua real identidade (sim, ela tem nome de verdade) com certeza estava lá pouco antes de parar e fitar a lua. Lógico, se não tivesse lhe evaporado aquela inspiração não haveria motivo por ter parado. Pensou se tal presença poderia ter sido um fascínio pela lua e agora, parado, com sua sede sanada, recebia o fim de uma possível embriaguez lunar. Rapidamente descartou a idéia: aquilo que havia passado era muito maior que a lua poderia ser, mesmo em noites de lua cheia como aquela. Mesmo a lua cheia, se comparada à dita presença, àquela inspiração em perceber a beleza de qualquer coisa, desde uma casa velha a um gato que corria em silêncio, seria apenas mais uma luz no céu. Concluiu: havia realmente parado e fitado a lua, e não parado para fitá-la. Chegou a pensar se havia tentado fazer da lua outra fonte de inspiração, como que para preencher a ausência que havia se instalado, mas pensou bem e percebeu que isso não vinha ao caso. O que vinha ao caso, e que havia se dado conta apenas naquele instante, era que a tal presença, tão óbvia quando presente e tão angustiante quando não mais lá, era um pensamento em sua mente. “No quê” seria a causa de tudo aquilo. Agora que tudo apenas começava a ficar claro, a confusão também era inevitável. Seria a tal presença esse pensamento em si ou o objeto real desse pensamento? Não fazia diferença, a conclusão de que o objeto do pensamento deveria ser forte o suficiente para que o simples ato de pensar naquilo lhe desse aquela sensação era tão inevitável quanto a confusão. E tão surpreendentemente natural! Nem havia percebido que passara a pensar naquilo - pois uma hora tinha que ter começado a pensar, o mundo não era assim tão belo normalmente. Disso lembrava bem. Mas também se lembrava do olhar satisfeito sobre a rua vazia nos momentos em que aquela ausência (que nada mais era que a volta à normalidade, no entanto sob o contraste do belo passado recente) ainda não existia, os passos largos, quase saltitantes. Olhava para os objetos da rua e os engrandecia, aproximando-os sem perceber àquele belo pensamento inconsciente que agora fazia falta. Resolveu continuar andando, talvez nunca descobrisse o foco de tal pensamento. Seria ele real? Oras, eram 5 da manhã e estava parado na rua. Digo, era mais difícil que estivesse sóbrio do que chegasse a encontrar o objeto do pensamento-presença. De qualquer forma, resolvera voltar a caminhar, mesmo que agora sem aquela inspiração. Mesmo que sem ver aquelas cores nas ruas de paralelepípedos chatos e mortos. Agora via a chatice do que é real, e via que o real é em preto e branco – especialmente em noites de lua cheia. O primeiro passo, teimosamente lento, como que para embalar, ou como um breve cochilo que se concede depois que toca o despertador, foi vazio. O segundo, pouco mais rápido, mas sem grande determinação, tão vazio quanto. Foi no terceiro que aconteceu. Tão rápido quanto quando a presença virou ausência. A fração do tempo, tão minúscula que não poderia ser dividida, que se consumira nesse acontecimento foi a mesma de quando o belo desconhecido lhe abandonou. Agora, impossível ser mais clichê, “tudo fazia sentido”. E as coisas ficaram claras como o sol que já começava a invadir a noite. A inspiração tinha motivo. Este motivo era a presença. Essa presença tinha um nome. Esse nome era Sofia.